Roberto James
Administrador e Mestre em Psicologia, professor, palestrante, especialista em comportamento do consumidor, especialista em logística, colunista das principais revistas do mercado.
Já faz um bom tempo que venho alertando os varejistas sobre a mudança de comportamento de consumo, principalmente quando se trata de consumo secundário, no caso consumo em postos de combustíveis. No livro O consumidor tem pressa: Corra com ele ou corra atrás dele, tenho abordado que a jornada está mais atrativa que o produto, que hoje está mais para coadjuvante no processo de decisão e por isso o consumidor tem que estar no palco principal.
Durante toda nossa vida, seguimos vivendo momentos e esses são armazenados no nosso cérebro, respeitando alguns pontos fundamentais. Dois deles que impactam diretamente o consumo são o impulso de sobrevivência e o prazer. Nossa mente, nosso organismo será sempre regido a tentar satisfazer esses pontos. Por isso a memória tem papel fundamental no processo decisório.
Ao entender essa linha é importante lembrar que o nosso cérebro guarda memórias ruins, de perigo ou que possam impedir qualquer dessas funções biológicas, de maneira que o acesso a elas é bem mais rápido e fácil. Com isso podemos afirmar que grande parte das decisões são inconscientes, ou parte das decisões ou até do processo de decisão são realizados de forma inconsciente.
Por que uma criança de um ou dois anos não teria medo e se aproxima de um animal como um jacaré, por exemplo? Ele não tem vivência, quantidade de memórias que possam reportar aquela situação, que aquele animal é perigoso. Quanto mais vivência nós temos, mais memórias e mais decisões e algumas são tão rápidas que o indivíduo não consegue traçar o processo pelo qual ela foi realizada.
Quantas vezes você já deu um passo para trás ao ouvir um barulho de uma buzina ou de uma freada? No seu cérebro não existe um processo interno, que abre um diálogo com você desse jeito: Cérebro - geralmente esses barulhos são seguidos de um veículo em alta velocidade ou desgovernado! O que então você responde: será que devo dar um passo para trás? Seu cérebro diz: exatamente e você dá o comando para as pernas, e tudo resolvido.
Se assim o fosse você já estaria morto. O processo é rápido e a decisão é tomada do mesmo jeito para lhe proteger. Em milésimos de segundos, sem você nem ter participado ativamente do debate, o cérebro comanda as pernas e você dá o passo para trás. Isso reflete diversos pontos de consumo e comportamento das pessoas ao consumir. Muitas vezes não sabemos o porquê de ter devolvido algo à prateleira ou de ter colocado no carrinho de compra.
TRANSFORME A JORNADA EM EXPERIÊNCIAS BOAS COM FOCO NO CLIENTE, NÃO NA VENDA!
A jornada de compra de um consumidor não começa quando ele entra na loja. Tem muito mais pontos envolvidos. Muitas vezes o processo já começou há dias e tudo aqui vai se formando e formatando num processo decisório que vai finalizar no ato de comprar ou adquirir o serviço.
Focar no produto, no marketing do produto, na promoção do produto, na exposição do mesmo vai tirar seus olhos do principal agente do processo de compra: O CLIENTE. Ele merece o foco total, ele merece a atenção, o cuidado, a interação e a sua preocupação.
Vamos falar de algumas dicar para isso acontecer na prática:
Primeiro, treine sua equipe para entender de clientes, personalizar o atendimento e o mais importante: MAIS QUE EXPLICAR SOBRE O PRODUTO, ENSINE SUA EQUIPE A OUVIR! Ouvir o cliente pode resolver mais da metade dos problemas sem nem precisar agir. Comunicação é importante.
Segundo, repense suas operações e burocracias. Segurança é importante, mas faça todo o ciclo de atendimento como se fosse o consumidor. Pense como ele e veja se o tempo utilizado está de acordo com alguém que está com pressa. Faça isso todos os anos e sempre que for adicionar qualquer nova etapa ou processo na sua empresa.
Terceiro, foco nos meios de pagamentos. É inadmissível que se demore tanto para realizar um pagamento nos dias de hoje. Troque sua internet, procure sua empresa de sistema e juntos busque a melhor saída para poupar tempo do cliente, não a maneira mais barata, mas a mais rápida para o consumidor.
COMO A MEMÓRIA FIDELIZA NA PRÁTICA?
Isso aconteceu comigo. Sempre abasteço em um posto próximo de casa e utilizo um app de desconto que adoro. Rápido, simples, com o desconto na hora como deve ser. Certa vez, estava voltando com a família inteira da praia e passei lá para abastecer. Ao terminar o abastecimento e utilizar o app para pagamento tive o primeiro problema, eu havia cancelado o cartão que estava cadastrado lá, e não me lembrava.
Ainda por cima o app não voltou para a tela de escolha se quer pagar em dinheiro. Apreensivo mostrei para o frentista que na mesma hora disse: vamos passar na máquina aqui e o senhor vai ter o mesmo desconto. Fiz as contas e foi exatamente como ele disse. Meu carro ficou parado de frente para uns freezers e ofereci picolé para a turma, comprei para todos e o mesmo frentista me atendeu. Fomos para casa felizes e satisfeitos.
Só fui fazer a análise do que aconteceu quando estava brincando com meu filho de 2 anos e meio, e num pequeno mapa da escola para a casa dele tinha um posto, e fomos fazendo o caminho quando eu disse a ele: Filho, aqui tem um posto de gasolina ao que Vinicius respondeu: E tem picolé, papai.
Na mesma hora tudo veio à tona. Aquele frentista deve ter tido muito trabalho para convencer seu gerente a me dar o desconto sem o comprovante do app. Deve ter dado trabalho fechar o caixa naquele dia. Mas o sentimento que tive, pensando depois da declaração de Vinni, foi que aquele frentista pensou em mim e na minha família. Pensou no meu tempo. Senti gratidão.
Acredito, que movido por esse sentimento na hora, tenha oferecido os picolés aos meus acompanhantes, e tenha gastado bem mais que o desconto que havia ganho no abastecer. Mas qual pai não fica feliz vendo sua família sorrir, com sorvete à vontade voltando da praia? Consciente ou inconsciente eu havia ganhado mais tempo do posto e resolveu dar mais de meu tempo e dinheiro ali, sem ao menos saber exatamente o “porquê”. Aprendi, na prática, que as memórias vão se formando no dia a dia e a melhor forma de fidelizar os clientes é tornar a visita deles uma experiência tão boa quanto a que eu tive. Problemas sempre existirão, mas a maneira como tratamos deles será um ponto de diferencial nesse processo. Continuo abastecendo nesse posto, por várias experiências, mas essa em si, foi a que mais marcou a mim e meu filho.
Imagine se a burocracia tivesse feito o frentista chamar o gerente, este teria que fazer procedimentos que iriam tirar minha paciência. Talvez dentro do carro eu bradaria algo com insatisfação e semanas depois, quando mostrasse uma foto de um posto para Vinicius, o que será que ele falaria?
Fidelize seu cliente com boas memórias. As grandes empresas já fazem isso. Não precisa de muito dinheiro, basta esforço e dedicação.
RJ